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Hedonismo a cilada das coisas lícitas




No capítulo 10 de I Coríntios[1] Paulo fala de um batismo universal, ensinando que todos os patriarcas israelitas passaram pela nuvem (presença de Deus) e pelo mar (presença do mundo), mas que a maioria deles não foi aprovada nesses testes, razão porque sucumbiram prostrados no deserto.
O fato é que o crivo parece rigoroso, pois só Josué e Calebe entraram na Canaã prometida, mas Deus não é rigoroso. Deus é Deus, e fez nascer o sol para justos e injustos, fez o sim para os aprovados e o não para o resto; o que passa disso, não é de Deus.
Se atentarmos para os cinco pecados que Paulo fala entre os versículos 6 e 10 do capítulo 10 dessa primeira carta à igreja de Corinto como causa impeditiva de herdar a promessa da terra, teremos a cobiça, a idolatria, a prostituição, a tentação ao Senhor e a murmuração, mas quando qualquer pessoa se encontra numa dessas situações não consegue entender a dimensão do seu pecado e alguns nem vêem sua conduta como desvio capaz de afastar a presença de Deus.
Vejamos como exemplo a idolatria[2], o que, para a maioria de nós se traduz pela veneração a imagens em geral, que os antigos chamavam de baalins, e é proibida pelo segundo mandamento em Êxodo 20:4, além de outros textos bíblicos, inclusive pelo livro apócrifo de Sabedoria, que só consta na Bíblia católica.
É sabido que muitos seguem falsos deuses, que em nada podem ajudar aos pobres e cegos devotos. Há pessoas que se envolvem, se dedicam e até se martirizam em insanas auto flagelações, e as estatísticas e censos mostram que quanto mais idólatra o povo de uma região nesse sentido, mais miséria suporta.
Contudo, Paulo não menciona esse tipo de idolatria como a que causou a perda do direito de conquista de Canaã pelo povo. Ele revela outra cilada que afastou, e ainda afasta de Deus, a grande maioria do povo: é a idolatria das coisas lícitas, a qual impede a muitos de usufruir das delícias da Canaã celestial e de todas as conquistas territoriais prometidas pelo Eterno.
O verso 7 do capítulo 10 descreve a idolatria dos que não entraram na terra da promessa e diz que “O povo assentou-se a comer e a beber, e levantou-se para folgar”.
É o caso de perguntar: É ou não é lícito comer, beber e folgar-se ? Também não é lícito viajar, festejar, comprar, assistir TV e acessar a internet, ir a um restaurante caro etc.?
É claro que todas essas coisas e muitas mais são lícitas, mas eu não posso deixar que nada disso me domine e ocupe o lugar que é de Deus em minha vida. Tem um tempo, uma escolha, uma primazia de dedicação que é devida a Deus e se essas coisas roubam essas experiências de caminhada do discípulo com Cristo é porque a idolatria se instalou sutilmente sem que ninguém precisasse se ajoelhar diante de estátuas de pau ou pedra.
A atual geração - especialmente os mais jovens - é bombardeada por apelos para folgar-se constantemente e, sem precisar consultar nenhum estudo científico, é possível afirmar que o marketing mais voraz tem investido com prioridade no comércio, no turismo e na indústria dos prazeres em geral, constrangendo aos que não consomem e nem necessitam. Os frutos são tão apetitosos quanto aquele que enredou o casal do Éden.
O termo idolatria vem do grego eidololatreía e latreia significa serviço. Então, idolatria é o mesmo que estar a serviço de um ídolo, de uma representação de pessoa ou coisa, real ou imaginária, que escraviza e domina nossas escolhas e sentidos. Acontece um verdadeiro encantamento que nos põe cegamente a serviço da coisa.
Sabemos que Jesus morreu para que os que vivem não vivam mais para si ou para seus prazeres, mas para Ele, que só depois de morto, pôde ressuscitar para a vida eterna. Todos os reinos do mundo foram oferecidos a Jesus[3], mas Ele preferiu mortificar sua carne, porque os prazeres da carne, mesmo os lícitos, podem roubar de nós a qualidade de vida que vale à pena, a vida de Deus, que nos dá acesso à terra prometida. Vale aqui a lição de Pedro, quando disse “de quem um homem é vencido, do mesmo é feito escravo[4]. Assim, por mais lícito que seja sorver um guisado de lentilha, não vale à pena trocar nossos direitos e conquistas perenes por manjares palacianos passageiros.
Deus tem Canaãs para nos dar, mas se estivermos com foco e a serviço dos prazeres sucumbiremos e prostraremos com nossas expectativas no meio do deserto e nunca conheceremos a terra prometida.

Por: Geraldo Luís Spagno Guimarães


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